Hoje meu pai completa 70 anos

Eu poderia escrever muitas coisas sobre este cara que eu chamo de pai e que a maioria das pessoas chama de Sergião.

Poderia falar sobre sua gentileza quase patológica e sobre como está sempre disposto a ajudar – até quem não deveria.

Poderia mencionar sua sensibilidade, que ele tenta disfarçar. Mas seus olhos brilham e se enchem toda vez que ele escuta uma história bonita, uma música antiga ou um poema sobre cachorros.

Poderia escrever um texto de mil páginas listando tudo o que meu pai já fez e ainda faz por mim, por nós, por quem ele quer bem e até por quem nem conhece. Sobre o quanto tocou e transformou a vida de tanta gente além dos muros do nosso quintal.

Só que não.

Eu não vou escrever sobre tudo isso e tanto mais.

Porque hoje quero agradecer por algo que só me liguei depois de crescer: a minha infância. Uma das fases mais importantes de nossas vidas; aquela que assenta a base de quem seremos amanhã.

A infância que eu tive, todas as crianças do mundo deveriam ter.

Fui uma criança muito feliz, amada e protegida, cercada de apoio, aconchego, incentivo, estabilidade, carinho, brincadeiras, livros, letras e cores. Nunca dormi sem ganhar um beijo de boa noite e, se eu tinha medo do escuro, a luz do corredor ficava acesa.

Quando meus pais se separaram (entre meus 3 e 6 anos, eu acho), sequer percebi. Tanto que não sei dizer exatamente quando eles terminaram e quando voltaram, pois não notei e, se eles não tivessem me contado depois, acho que até hoje não saberia. Porque meu pai nunca foi embora. Ele estava sempre em nossa casa, me levando e me buscando na escola, brincando comigo, participando ativamente da minha vida. Aniversário, Natal, apresentação no colégio, um dia qualquer: ele estava lá.

Essa infância cheia de encanto e amor, eu só percebi que era um privilégio quando cresci um pouco e, chocada, descobri que nem todas as crianças viviam como eu. Havia muito abandono, maus-tratos, violências, desrespeito e descaso. Muitas crianças como eu não tinham um pai como o meu. Muitas sequer conheciam seu pai.

E é por isso que hoje eu te agradeço, pai.

Muito obrigada pela infância querida e doce que você me deu, que formou o alicerce onde eu cresci com segurança e apoio, e sem o qual eu não seria eu. Obrigada por cuidar das minhas asas, ao invés de cortá-las.

Escolhi essa foto porque penso que ela define exatamente o que quero dizer com este texto. Você, depois de um dia inteiro de trabalho, talvez estressado e com certeza cansado, ao chegar em casa jogou-se no chão para brincar comigo. Provavelmente, nesta ocasião, eu aguardava ansiosa você chegar.

E você chegou, como chegava todas as noites. Você sempre voltou no fim do dia. E hoje, já adulta, eu fico pensando: quantas crianças, como eu, também aguardavam seu pai voltar diariamente? Quantas ficavam olhando para a porta, esperando que se abrisse e seu pai por ali passasse? Para quantas isso nunca aconteceu?

Pra mim, acontecia todo dia. E não existe maneira e nem palavras para agradecer pela sua presença. Uma presença que está presente até quando está distante. Que preenche e aquece, protege e cuida, ampara e ama.

Muito obrigada por me amar, pai!

Por sempre voltar, por nunca ir, por estar aqui.

Eu e o mundo somos melhores porque você existe.






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