Eu, de esquerda?


Eu escrevo crônicas desde 2004. Sempre tive blog, e também já publiquei em sites, revistas, livros e jornais ao longo dos anos. Em 2018, lá se vão cinco primaveras que escrevo quinzenalmente para o jornal O Informativo Regional, de Sananduva/RS, e pelo menos dois anos que mantenho uma coluna no jornal A Folha, de Não-Me-Toque/RS. Não sou capaz de contar quantas crônicas já escrevi na vida, mas foram algumas centenas. Nestes textos, desde os primeiros até os últimos, sempre procurei refletir o meu tempo, como ensinou Nina Simone, abordando temas pertinentes à nossa realidade. De modo que, quem já leu pelo menos cinco crônicas minhas, sabe que racismo, machismo, homofobia e direitos humanos são assuntos recorrentes em meu trabalho. Tem política em cada caractere que eu digito.
Apesar disso, jamais me posicionei a favor de um partido ou de um determinado candidato, bem pelo contrário. Sempre deixei claro que, não importa quem está no poder, eu sou contra, inclusive e principalmente se for o cara em quem eu votei. Político, pra mim, não deve ser amado e venerado, mas vigiado e cobrado, e tanto faz de que lado ele está. Se há governo, sou oposição.
Entretanto, nestes tempos de loucura extrema, tenho percebido uma reação inédita e estranha aos meus textos. Algo que, até então, nunca havia acontecido. Pela primeira vez na vida me chamam de esquerdopata, petralha, comunista e aborteira (oi?) porque escrevo, como sempre escrevi, sobre racismo, machismo, homofobia e direitos humanos. Já me mandaram ir morar em Cuba ou na Venezuela porque escrevi um texto contra a censura.
Confesso que, de início, fiquei um pouco chocada. Na minha imensa ingenuidade, lutar pela igualdade e contra a violência do preconceito é o mínimo que devemos fazer, se desejamos um país menos triste para viver. Direitos humanos, afinal, são para humanos, como o próprio nome diz, não importa sua identidade política ou ideológica, sua classe, cor, sexo ou time. Não dá para entender como direitos humanos pode ser “coisa de esquerda”, se “os de direita” também são humanos. Apenas não faz nenhum sentido.
Mas o que faz sentido, não é mesmo?
O que posso garantir, nesta altura do campeonato, é que, enquanto puder, seguirei escrevendo minhas crônicas, defendendo os direitos daqueles que têm os seus direitos descaradamente cerceados – grupo no qual posso me incluir, já que, apesar de branca, heterossexual, classe média e etc., continuo sendo mulher, vulnerável ao machismo institucionalizado que agride e mata todo dia, todo o tempo. Grupo no qual incluo muitos amigos, muitos amores, muitos queridos, muitos familiares. Eu amo muitas pessoas, e elas são negras, lésbicas, gays, travestis, transexuais, nordestinas, marginalizadas, periféricas, maltratadas, e jamais deixarei de usar a minha única arma, que é a literatura, para batalhar pelo direito que todas elas (todos nós!) têm de serem tratadas como seres humanos.
Isso me torna “de esquerda”?
Pois bem. Para meu próprio espanto e decepção de papai, declaro ao mundo que então eu sou de esquerda.

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