A gaiola da repetição
De vez em quando me pego pensando
que muitas pessoas assumem posições e opiniões sem saber, exatamente, o que
estão assumindo. Porque, se soubessem, não as assumiriam, sob o risco de
colocar o seu pescoço e a sua liberdade em jogo.
Como papagaios, que repetem as
palavras que lhe são ensinadas, “Dá o pé, Rico”, sem ter a mínima noção do que
significam, nós também reproduzimos discursos sobre os quais não entendemos
coisa nenhuma. Para o papagaio, palavras são apenas sons de comando, não
ideias. Assim como para muitos de nós.
Esta completa ausência de
consciência fica ainda mais evidente na argumentação que procede estes discursos
ocos. Isto é, na falta de. Qualquer possível debate morre afogado no raso,
antes mesmo de se aprofundar, visto que não é possível dialogar com um
papagaio.
O problema é que tais posições
geralmente dizem respeito a questões públicas, e não particulares; refletem-se
no todo, e não apenas em nosso espelho. E é neste momento que os papagaios, de
inofensivos, tornam-se ameaçadores.
Porque ajustamos os fatos às
nossas opiniões; a realidade às nossas crenças; o país ao nosso quintal.
Desconhecemos o verdadeiro sentido das palavras que apregoamos com tanta
convicção. Achamos que descriminalizar e legalizar significa incentivar e
aplaudir. Confundimos educação sexual com pornografia. De Estado Laico, nunca
ouvimos falar. Clamamos por intervenção militar sem saber o que representa. Colocamos
a Bíblia acima da Constituição; a individualidade acima da coletividade, o eu
acima de todos.
O resultado, nós estamos vendo
com estes olhos que a terra há de comer: centenas, milhares, milhões de
papagaios, repetindo ordenadamente o que escutam, sem pensar, sem questionar,
sem analisar, sem compreender. Só repetindo, repetindo e repetindo.
Não sejamos mais um papagaio
nesta gaiola de papagaios, amigo leitor, amiga leitora. Chega de “Dar o pé,
Rico”. Vamos parar de reproduzir discursos prontos, sobre os quais nada
sabemos, e buscar conhecimento em livros, filmes e documentários, e não somente
no Facebook e no WhatsApp.
Podemos entender o que estamos
só repetindo.
Caso contrário, seguiremos como
papagaios, engaiolados pela nossa ignorância e tratando as palavras apenas como
sons de comando.