Ingênuos, como toda criança
Nós acreditamos piamente na
propaganda da TV, garantindo que só seremos felizes e legais quando comprarmos este
carro, este celular ou este sabonete, tal e qual uma criança que acredita em
Papai Noel e Fada dos Dentes.
Defendemos com convicção o
discurso deste ou daquele político, deste ou daquele partido, deste ou daquele
lado, como a criança defende seu brinquedo preferido.
Brigamos com dedicação por
causa de bandeiras, siglas e insígnias, igualzinho a criança que briga com o
coleguinha no recreio pra ver quem vai comprar o lanche primeiro.
Confiamos cegamente em gurus,
guias, pastores e mestres espirituais, do mesmo jeito que uma criança confia
cegamente em sua mamãe.
A realidade, amigos leitores, é
que, enquanto sociedade, ainda estamos em plena infância mental e emocional. Agimos
e reagimos feito criancinhas diante de tudo o que nos contraria ou fuja de
nossa minúscula zona de conforto.
Claro que, como todo ingênuo,
não achamos que somos ingênuos.
Como toda criança, juramos que não
somos mais crianças; dizemos por aí que já crescemos e viramos mocinhos e
mocinhas. Nós nos consideramos muito espertos e inteligentes, muito observadores,
muito astutos e racionais. Mas, como toda criança, ainda acreditamos em fantasia e ficção; procuramos
respostas simples para problemas complexos; criamos e fartamente alimentamos
nossas ilusões. E é exatamente assim que nos tornamos alvos fáceis de enganar e
manipular. Porque ficamos completamente vulneráveis a quem
nos oferece uma solução rápida e descomplicada, seja uma propaganda, um
político, um emblema, uma bandeira, um mentor espiritual. Como uma criança, que
ganha um pirulito para parar de chorar e espernear.
Contudo não se
engane, caro leitor, cara leitora: diferentemente das crianças, nossa ingenuidade
não é sinônimo de inocência. Especialmente por que nossa infantilidade mental e
emocional não é espontânea, orgânica, natural; ela é optativa. Nós escolhemos
ser ingênuos por conta do nosso medo imenso em assumir os compromissos que
deixar de ser ingênuo acarreta.
Porque crescer dói.
É confuso, difícil, penoso e, não raramente, um saco. Exige caminhar sozinho,
sem ajuda do andador, e adquirir responsabilidades, aprender a duvidar e questionar
– inclusive e principalmente nossa própria postura e conduta. Exige abrir mão
dos caprichos e das utopias; desenvolver um olhar minimamente crítico; desapegar
dos velhos e rançosos ideais. Exige aprender, mais do que ensinar. Perguntar,
mais do que responder. Ouvir, mais do que falar. Exige perceber que não existe
preto ou branco, e sim algumas centenas de milhares de tons de cinza. Exige
abrir mão de fórmulas mágicas, heróis, contos de fada. Exige parar de se
distrair com um pirulito.
Pode ser traumático
para alguns e é assustador para todos. No entanto, enquanto seguirmos neste
jardim de infância mental, continuaremos exatamente onde estamos: como
crianças, defendendo seu brinquedo preferido e brigando com o coleguinha no
recreio para ver quem vai comprar o lanche primeiro.