Esperança é seu nome
Ainda
estava escuro quando saí de casa perto das 7h da manhã do dia 9 de julho de
2021. Meu destino: a Acapesu, o local onde ocorria a vacinação para pessoas a
partir de 36 anos aqui em Carazinho. Na noite anterior, dormi e sonhei que me
vacinava. Quando acordei, não era sonho. A minha vez finalmente chegou!
Os
portões seriam abertos às 8h e eu queria me garantir, por isso fui uma hora
antes. Devia ter umas 50 pessoas na minha frente. Cheguei, peguei meu lugar na
fila e ali fiquei, não acreditando que era verdade. Sorte que eu usava máscara,
ou as pessoas em volta se perguntariam por que raios aquela louca estava rindo
sozinha. Era impossível não rir. Minha boca sorria involuntariamente.
Foi
quando começou a amanhecer.
No
horizonte, o alaranjado do sol anunciava um dia bonito. Eu, que agora tenho
mania de poeta e enxergo versos até onde não têm, não consegui não ver a
simbologia daquele momento. Não era só o dia que amanhecia. Eu amanhecia
também.
Um
sentimento que há muito não me visitava invadiu meu coração. Esperança é seu
nome. Esperança em um futuro que nos espera logo na esquina. Esperança de não
só sobreviver, mas viver, prosperar e voltar a ser feliz e sonhar. O laranja do
céu deu lugar ao azul e o sol nasceu. Quando os primeiros raios se derramaram
sobre Carazinho, os portões abriram e a fila começou a andar.
Então
eu chorei, as lágrimas encharcaram as duas máscaras que eu usava. Chorei porque
não acreditava mais. Porque, até pouco tempo, olhava pra frente, pra trás e
para os lados e só via névoa e escuridão. Chorei porque estava muito cansada de
sentir medo. Chorei pelos meus queridos que partiram antes da vacina chegar – e
foram tantos! Chorei porque os passos que eu dava naquele instante me levavam
para receber este néctar bendito chamado vacina, que vem defendendo a
humanidade há séculos e que, mais uma vez, haverá de nos defender. Foi assim
que vencemos a varíola, a paralisia infantil, a peste negra, só pra citar as
mais graves. E é assim que venceremos o coronavírus.
Sei que
ainda temos um longo e árduo caminho pela frente.
Sei que
muitos irmãos brasileiros não tiveram tempo de esperar pela vacina e partiram
sem nenhuma chance.
Sei
que, enquanto meu coração se enche, o coração de milhares, de milhões, se
esvazia na dor do luto, da revolta e da saudade.
E eu me
enluto, me revolto e choro toda essa saudade junto com o Brasil e com cada
brasileiro. No entanto, essa vacina me permitirá, como a muitos, seguir VIVA e
FORTE para lutar por um país que é gigante, mas que, desde 2018, se apequenou,
se acovardou e se reduziu, permitindo que as ratazanas saíssem dos bueiros e subissem
em nossas mesas e camas, triturando tudo o que encontravam pela frente.
Cada
vacina aplicada no braço de cada brasileiro é um golpe neste desgoverno
genocida. É um ato de resistência da vida contra a morte imposta por um
governante desequilibrado, boçal e cruel, que se diverte e debocha de seu
próprio povo enlutado, abandonado, doente e sem ar. Que ri ao ver cadáveres
empilhados. Que cospe e profana o túmulo de quem morreu por conta de um vírus
para o qual já existe vacina há meses. Um governo perverso e pervertido que,
deliberadamente, colocou preço em nossas vidas: 1 dólar. UM maldito DÓLAR!
Ainda
está escuro, eu sei.
Ainda é
noite no Brasil.
Mas
repare o horizonte: já está alaranjado.
Sinal
que, não demora, amanhece, e os primeiros raios do sol vão mandar os ratos e os
bichos escrotos de volta aos esgotos, lugar de onde nunca deveriam ter saído.